terça-feira, janeiro 3

A Longa Noite dos Mortos Vivos Cafuçu

por Ivanildo Abdias


O clamor em tintas histéricas e o tom apocalíptico por conta da greve de policiais militares (e até bombeiros) que assolou a alencarina capital do estado do Ceará merecem a referência ao filme dirigido em 1968 por George Romero. O reforço estilístico do cafuçu atribuído é por nossa conta.
Já essa, bem, não tão noite, será longa.
Espetáculos fantasiosos a parte o que sobra nestes tijolos sem cimento é a charmosa ideia de que fomos bons em algo como em muito não lembro. Nossa comunhão de loucura e ode ao mau gosto não coube em sí, e já pelo horário do almoço dava suas maiores demonstrações de indigestão.
Caminhei pela cidade vazia em sua costumeira faixa de intenções. Silenciosa, pude perguntar sem demora do que tanto ela tem medo.

A PALAVRA É: ARRASTÃO
E no arrasto de tantas emoções que talvez ainda guardem resquícios dos festejos de final de ano, seguramos com cuidado nossas bolsas, aceleramos com telefonemas nossos celulares pré-pagos cheios de recursos tecnológicos e arrastamos o enclausuramento como envidamento de breguice. Na verdade, o que mais senti falta neste 3 de janeiro de nosso senhor foi de nossos generosos novos ricos em seus potentes carros a tocar o melhor forró. Onde eles estavam com sua deliciosa mistura de uísque e energético. Escondidos e amofinados com medo de nossa versão PCC brejeira? Fortaleza, Loira desposada do sol que não se lembra que está abaixo de dez capitais brasileiras em número de bibliotecas e cinemas por habitante. Terra do humor, coisa essa que faltou no dia de hoje, aliás, isso nem existe com o bucho cheio de caranguejo.

FOMOS TODOS ELY AGUIARES
As redes sociais destilaram sua eficaz contribuição no circo de baboseiras. O que fatalmente acabou ajudando nossos amigos jornalistas que cretinamente já cansados não aguentavam mais repetir a mesma ladainha. Embasbacados sacaram algo novo da manga e anunciaram: "as redes sociais participam como nunca nesse dia triste... bah,bah".
Fomos todos Águias, cidades 190, Elys... Vacilamos no cadafalso boçal que nos acostumamos a pisar. Tivemos medo dos pobres e periféricos a invadir nossas casinhas. Nos borramos ante a possibilidade de revidar a violência contra toda ordem de crack babe e assassino que nos encontre. Monas loucas ou gente que na verdade só queria sair mais cedo do trabalho e encontrou no pavor a desculpa?
Só sei que escutei algo a muito não veiculado em nossos meios de comunicação: "Homens do exército revistam qualquer pessoa que eles achem suspeitos..."
Termino este humilde ensaio sobre a Primavera da Polícia Militar Cearense com a última citação em vida de um bom homem, no caso, alguém que conhecia a noite melhor que todos nós.
"Eu nunca deveria ter mudado de Scotch para Martinis"
                                                                                                                                         Humphrey Bogart